O jogo amistoso entre as seleções de Angola e Argentina, marcado para o dia 14 deste mês, em Luanda, continua a gerar polémica. A partida, que contará com a presença do astro Lionel Messi, é, segundo o Governo, um presente para o povo angolano no âmbito da celebração dos 50 anos da independência.
No entanto, até ao momento, a origem do dinheiro usado para pagar os argentinos não foi revelada e a sociedade civil continua a apelar ao boicote do jogo.
As duas seleções vão defrontar-se no Estádio 11 de Novembro, cuja requalificação, feita para acolher o jogo, custou aos cofres do Estado 13,6 milhões de dólares, segundo o Jornal de Angola. Fontes apontam que Angola pagou cerca de 32 milhões de dólares à Argentina — 20 milhões à seleção campeã do mundo e 12 milhões pela presença da estrela Lionel Messi em Luanda.
Em entrevista à TV Zimbo, o ministro da Juventude e Desportos, Rui Falcão, afirmou que foi a própria seleção da Argentina que manifestou interesse em jogar com Angola, recusando-se a comentar sobre o montante envolvido.
“Vou dizer-vos o seguinte: A própria Argentina, por interpostas pessoas, manifestou interesse em vir jogar a África, no momento em que estávamos a preparar o programa dos 50 anos”, disse.
Governo não revela origem dos fundos
Entretanto, a declaração do ministro contrasta com a do Presidente João Lourenço, feita no ano passado, quando anunciou aos jovens do seu partido, a Juventude do Movimento Popular de Libertação de Angola (JMPLA), que o Governo convidou a Argentina para a celebração dos 50 anos da independência de Angola.
“Convidámos a seleção destes gigantes do futebol mundial por todos nós conhecidos – Diego Maradona e Lionel Messi – para vir a Angola no próximo ano jogar contra os nossos Palancas”, afirmou.
Quanto à origem dos fundos, o Governo não revela detalhes, dizendo apenas que houve contribuição de alguns empresários.
Até ao momento, apenas o empresário e político do MPLA, Bento Kangamba, dono do Kabuscorp do Palanca, assumiu ser um dos patrocinadores do amistoso. Kangamba afirmou que vai financiar o jogo com cerca de 6 milhões de dólares.
A sociedade civil critica a falta de transparência nos gastos públicos associados ao evento.
Gastos desajustados?
O diretor executivo da ONG Friends Of Angola (FoA), Florindo Chivucute, considera os gastos desajustados com a realidade social e financeira do país.
Chivucute recorda o Índice Global da Fome 2025, cujo relatório coloca Angola entre os 13 piores países do mundo e como o pior país da lusofonia, onde 47,7% das crianças sofrem de atraso no crescimento e 22,1% da população está subnutrida.
“Em várias províncias, famílias são obrigadas a recorrem ao lixo em busca de comida, ilustrando uma crise social profunda e estrutural. No entanto, isso não deve ser prioridade do Executivo que está aí para representar o povo angolano”, crititou.
Florindo Chivucute apela aos angolanos que exijam mais transparência do Governo na gestão do dinheiro do país.
“Quem está a pagar? E de onde vem este dinheiro? É importante prestar contas ao povo angolano. Também é importante uma revisão das prioridades orçamentais destinados à educação, à saúde e à segurança alimentar e habitação digna”, opinou.
Por seu lado, o movimento cívico Todos, liderado pelo ativista Nelson Dembo, conhecido por Gangsta, exorta os populares que forem ao estádio no dia 14 a protestarem, do início ao fim do jogo.
“Vamos transformar o estádio como uma arma para a revolução, utilizando as nossas vozes gritando bem alto ‘temos fome’ do princípio ao fim do jogo. É extremamente importante passar esta mensagem à imprensa internacional que estará lá, porque será um jogo mediático”, referiu.
O jogo entre Angola e Argentina promete repercutir além das quatro linhas. Enquanto o Governo o apresenta como um símbolo de orgulho nacional, ativistas e organizações civis veem no amistoso o retrato de um país onde a festa do futebol contrasta com a fome e a pobreza da maioria da população.